quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

BRASIL VENDE 100 MÍSSEIS ANTI-RADIAÇÃO PARA O PAQUISTÃO

Li ontem no jornal Folha de São Paulo o seguinte texto de Eliane Cantanhêde, colunista da Folha, Iuri Dantas, da sucursal de Brasília, e Igor Gielow, secretário de redação da sucursal de Brasília:

EM MEIO À CRISE NA ÁSIA, BRASIL VENDE MÍSSEIS A ISLAMABAD

Para Jobim, vetar operação seria acusar governo paquistanês de terrorismo; negócio com a Mectron terá garantia do Banco do Brasil

“Passando ao largo da tensão diplomática entre Índia e Paquistão por causa dos atentados que causaram 172 mortes em Mumbai, o Brasil concedeu ontem um seguro de crédito à exportação de cem mísseis produzidos pela empresa paulista Mectron para o governo paquistanês equipar seus aviões de combate.

A Embaixada da Índia não emitiu nenhuma opinião sobre o caso, mas enviou representante ao Itamaraty para consultar o governo brasileiro sobre a decisão. O embaixador indiano estava no Rio e foi informado por telefone.

O contrato é de 85 milhões, e Islamabad exigiu que o governo brasileiro entrasse como "avalista" financeiro e político do negócio, que se arrastava há mais de um ano -a assinatura do protocolo de intenções entre Mectron, Paquistão e Força Aérea Brasileira havia ocorrido em abril. A garantia financeira, um seguro de crédito de 25 milhões, será dada pelo Banco do Brasil.

A decisão foi tomada em reunião extraordinária da Camex (Câmara de Comércio Exterior) ontem, convocada pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim. Dois dos participantes questionaram politicamente a decisão neste momento em que a Índia acusa o Paquistão de envolvimento, ainda que indireto, com os atentados.

Os dois países, potências nucleares, já foram à guerra três vezes desde que se separaram em 1947, com a independência do Império Britânico.

O ministro Paulo Bernardo (Planejamento) perguntou a Jobim: "Muito bem, mas e a questão geopolítica?"

Em seguida, o secretário-geral das Relações Exteriores, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, disse que temia reações internas e externas à decisão neste momento. "Fico muito preocupado", declarou na reunião, segundo relatos ouvidos pela Folha.

Diante dos questionamentos, Jobim afirmou que a negociação é entre países. "O negócio é com o governo paquistanês, e não com terroristas do Paquistão. Se cancelássemos o negócio, estaríamos atribuindo ao governo paquistanês atividades terroristas."

Bernardo e Guimarães concordaram e votaram a favor. "Realmente não podemos acrescentar um elemento de julgamento na nossa decisão. Negar, seria julgar o governo do Paquistão", disse o diplomata na reunião em que representou o chanceler Celso Amorim.

O Paquistão pressionava pela decisão brasileira havia meses, mas uma coincidência chamou a atenção de quem acompanha o mercado de armas: a intermediação da venda foi feita pelo mesmo grupo paquistanês que ajudou o governo russo a vender 12 helicópteros de ataque ao Brasil na semana passada. A proximidade poderia indicar, segundo analistas, um "pacote fechado" em duas pontas pelos intermediários.

Os mísseis em questão são do modelo MAR-1. É um míssil anti-radiação, ou seja, ele captura sinais de radar e persegue a fonte emissora. O MAR-1 é especificado para atingir alvos emissores de radar em terra -ou seja, baterias antiaéreas.

Começou a ser desenvolvido em 1998 pela Aeronáutica e a Mectron e sofreu boicote no ano seguinte dos Estados Unidos, que vetaram a venda de uma antena de seu sistema receptor de radar por considerar que estaria permitindo a inserção de uma nova tecnologia militar na América do Sul.

A solução encontrada foi improvisar um produto nacionalizado. Deu certo, e o míssil já está em fase de ensaio operacional. Só a FAB investiu cerca de US$ 26 milhões no projeto. O MAR-1 foi desenhado para ser instalado no caça de ataque a solo AMX, mas é facilmente integrado a aviões como os Mirage paquistaneses.

Segundo a Folha apurou, o Paquistão vai adiantar parte do contrato para que a Mectron amplie sua capacidade de produção. Com o adiantamento, a Mectron conseguirá fabricar cinco mísseis por mês, contra apenas um hoje. Não será, contudo, com esse lote de produtos que o Paquistão terá algum tipo de vantagem tática ou estratégica numa hipotética guerra com o eterno rival.

Sobre o mesmo assunto, o jornal Gazeta Mercantil, em texto de Viviane Monteiro, ontem publicou:

CAMEX APROVA VENDA DE MÍSSEIS

“Brasília, 3 de Dezembro de 2008 - A Câmara de Comércio Exterior (Camex) deu o aval para a Mectron, fabricante de mísseis anti-radiação, possa exportar 100 mísseis para o governo do Paquistão. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, informou que o governo federal concederá garantias para que a empresa, situada em São José dos Campos (SP), possa exportar os 100 mísseis anti-radiação (NARI) para o país asiático.

O ministro lembrou que o negócio havia sido fechado em 23 de abril deste ano entre a Força Area Brasileira (FAB), a Mectron e a Força Area do Paquistão, no valor de 85 milhões de euros. Porém, o negócio dependia da aprovação de garantias do governo do Brasil para tal operação. Após participar da reunião da Camex, órgão vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Jobim esquivou-se de responder se as garantias seriam concedidas pelo BNDES que é sócio da empresa paulista e qual o valor das garantias. "A reunião foi realizada apenas para aprovarmos essa operação", esquivou-se o ministro.

Para o ministro, esse é um negócio importante para a Mectron, pois aumentará em cinco vezes a capacidade de produção da empresa, que hoje produz apenas um míssil por mês.

Com o acordo, a expectativa é que a produção salte para cinco mísseis mensais. "A nossa tendência em defesa é exatamente estimular o desenvolvimento. Com essa negociação, a Mectron passará a produzir cinco mísseis por mês, o que vai ampliar a mão-de-obra e a qualificação da empresa", disse Jobim. A Mectron possui, em seu quadro de especialistas, cinco engenheiros formados pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

Sobre os atentados terroristas na Índia, que foram atribuídos a terroristas paquistaneses, o ministro se antecipou em responder. "Não sei se os terroristas são paquistaneses, mas o negócio que estamos fazendo é com o governo paquistanês e não com terroristas paquistaneses", justificou-se.

Embora o governo brasileiro tenha aprovado garantias para a Mectron exportar os equipamentos para o Paquistão, o ministro assegurou que o governo paquistanês "já dispõe" dos 85 milhões de euros. Dessa forma, complementa, a empresa terá condições de quintuplicar a sua capacidade produtiva, "inclusive em pesquisa", avaliou Jobim.

O ministro explicou que os mísseis anti-radiação (NARI) são acoplados em aviões, em plataformas, e são utilizados para identificar origens de radiação e emissão de radiação de radares. "Eles têm a possibilidade de destruir o radar se quiserem, mas funcionam como monitoramento. É um instrumento de monitoramento muito eficaz . Pelo espaço, ele faz o monitoramento da terra, localiza e, se eventualmente, houver uma decisão, ele pode destruir o radar", disse o ministro.”

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