sexta-feira, 13 de março de 2015

A "LAVA JATO" VISTA DA ÓTICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO





A Lava Jato, vista da ótica do Ministério Público

Por Luis Nassif

"A lista do PGR (Procurador Geral da República) Rodrigo Janot, sobre a Lava Jato, ainda não é a lista de Janot. A lista definitiva só surgirá daqui a alguns meses, quando forem encerrados os inquéritos abertos agora.

Como os procuradores gostam de repetir, indiciados não são culpados. Só após as investigações se terá a verdadeira lista, dos acusados, dos inocentados ou daqueles contra os quais não se obteve prova.

Não se deve analisar os indiciados pela mesma régua. Em alguns inquéritos, há abundância de detalhes; em outros, não.

Até agora, o PGR limitou-se a pedir inquéritos contra pessoas com foro privilegiado citados nas delações premiadas, mas seguindo alguns critérios.

As regras da delação

O critério para o indiciamento é o confronto das duas delações e o nível de detalhamento das acusações. Pela Lei da Delação Premiada, para valer em juízo a delação precisa ser corroborada por outras delações.

Os procedimentos são os seguintes:

1. Entra-se em contato com o advogado do suspeito.

2. Negociam-se os termos da delação: o que o delator tem a oferecer e o que o procurador pode prometer de redução de pena, condicionado à homologação do STF.

A delação premiada é essencialmente um depoimento oral. Em si mesmo, não vale nada. É apenas um ponto de partida, que poderá ser confirmado ou não pelas provas.

No Paraná, as investigações focaram apenas os operadores administrativos e financeiros, que não tinham prerrogativa de foro. Se o grupo paranaense da Lava Jato avançasse nas investigações contra quem tivesse foro privilegiado, violaria a competência do PGR e do STF, podendo anular as investigações.

Por isso mesmo, o que se tem até agora são apenas investigações horizontais, focadas exclusivamente em duas delações premiadas orais (ou seja, sem apresentação de provas): do doleiro Alberto Yousseff e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Das 15 delações até agora, foram as únicas que foram homologadas pelo STF e envolveram pessoas com foro privilegiado.

A partir daí, o PGR pede autorização ao STF (Supremo Tribunal Federal) para abrir investigações.

Só depois da homologação, o PGR inicia as investigações. Todas elas ficarão sob responsabilidade do PGR, e não mais da Polícia Federal - como ocorre nos inquéritos normais.

A demora em pedir os inquéritos deveu-se aos problemas de saúde enfrentados pelo doleiro Yousseff, que foi várias vezes hospitalizado. O PGR optou por esperar o fim dos depoimentos, para não se basear apenas em Costa. Só no final do ano passado terminou a delação de Yousseff.

Na PGR, o inquérito 5260 é considerado o inquérito-mãe, o que poderá identificar de fato a organização criminosa.

As hipóteses de trabalho


Segundo procuradores, há uma preocupação excessiva dos jornais com a fase da investigação - que, por si só, não tem valor nenhum. Um dos riscos é revelar demais nas etapas da investigação e não dar consequência.

Os procuradores trabalham com a hipótese de três esquemas de financiamento eleitoral: o do PP (Partido Progressista), do PMDB e do PT.[Excluído, por blindagem antecipada, o PSDB?].

Costa e Yousseff atuavam para o PP, daí o envolvimento de grande número de parlamentares do partido. Em determinado momento, Paulo Roberto enfraqueceu-se e buscou apoio do presidente do Senado Renan Calheiros, do PMDB. É por aí que se entende o envolvimento de parlamentares do PMDB.

O elemento-chave do PMDB na Petrobras era o diretor Nestor Serveró, que até agora não abriu o bico, e o operador Fernando Baiano. Do lado do PT, seria o diretor Renato Duque e o tesoureiro do partido, João Vaccari.

Para os procuradores, o depoimento mais "revelador", até agora, foi do ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco, procurando envolver Vaccari,

Um dos inquéritos com maior número de evidências é o que envolve o presidente da Câmara Eduardo Cunha.

O delator mencionou um contrato de aluguel de um navio sonda da Samsung. A comissão foi paga a Júlio Camargo que repassou parte dela para Fernando Baiano e Eduardo Cunha.

A Samsung parou de pagar a comissão. Imediatamente, Cunha valeu-se de uma deputada ligada a ele para apresentar uma representação em uma comissão da Câmara, exigindo informações da Petrobras. Imediatamente, Júlio Camargo retomou os pagamentos, bancando do próprio bolso.

Interrogada, a deputado (que não foi reeleita) sequer sabia o significado da representação apresentada.

Próximas etapas

A partir de agora, o PGR, com uma equipe direta de 11 procuradores, mais a estrutura da Procuradoria, irá atrás das provas.

Olhando-se o sistema de cima, Yousseff montou quase uma instituição financeira clandestina. Organizou o que o site da Interpol chama de "Hawala", um esquema de compensação, como uma espécie de Banco Central, com offshores, doleiros, corruptos de todos os naipes.

Nessa enorme teia, será mais fácil identificar dinheiro que transita em meio eletrônico.

Mas grande parte dos pagamentos ilícitos é feita com dinheiro vivo, recorrendo a vários subterfúgios. Um deles é atravessar a fronteira camuflando dinheiro na roupa.

Outro, é valer-se de obras de arte. Atravessa-se a alfândega com um quadro que será vendido em leilão no exterior. Há casos de alguns artistas brasileiros que vêm obtendo preços recordes em leilões internacionais. Não se duvide de alguma forma de esquentamento de dinheiro. Ou então, jóias valiosas, no pulso, dedo ou pescoço de uma senhora bem apessoada.

Outra forma de operação é através do internet bank. Entrega-se um ativo para o operador financeiro brasileiro. Depois, uma operação de pagamento no exterior, através de bancos eletrônicos. Ou então, meros acertos de conta: a pessoa A deve para a pessoa C que deve para a pessoa D. Faz-se um acerto de contas sem que as pessoas se conheçam.

Segundo os procuradores, as únicas formas de identificar claramente o jogo é através dos institutos da delação e da interceptação telefônica."

FONTE: escrito por Luis Nassif no "Jornal GGN" (http://jornalggn.com.br/noticia/a-lava-jato-vista-da-otica-do-ministerio-publico). [Trecho entre colchetes acrescentado por este blog 'democracia&política'].

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