domingo, 10 de agosto de 2014

O HILARIANTE "ESCÂNDALO" DA WIKIPÉDIA




O "escândalo da Wikipédia" e a autofagia da "TV Globo"


Por Wilson Roberto Vieira Ferreira 

"O “escândalo da fraude da Wikipédia” é a confirmação de que nada mais resta para a grande mídia do que a bomba semiótica da não-noticia. Em nova “denúncia”, jornalistas Miriam Leitão e Carlos Sardenberg tiveram seus perfis na enciclopédia virtual Wikipédia “fraudados” com a inserção de difamações e críticas. E tudo teria partido do endereço virtual “da presidência”... ou teria sido “do Palácio do Planalto”... ou, então, “de um rede pública de wi-fi?”. 

A ambiguidade dá pernas à não-notícia que revela um insólito desdobramento de um jornalismo cuja fonte primária (a Wikipédia) nega a si própria como fonte confiável de investigação. Abre uma surreal possibilidade de um tipo de jornalismo que se basearia exclusivamente em fontes onde o próprio repórter pode criá-las para turbinar a sua pauta. E de quebra revela o momento autofágico da "TV Globo" que oferece suas próprias estrelas jornalísticas em sacrifício no seu desespero de ter que lutar em duas frentes simultâneas: a política[partidária] e a audiência.

Com o “escândalo Wikipédia” e a perspectiva de uma hilária “CPI do wi fi” está se confirmando que, na atual batalha semiótica pela opinião pública, a única arma que restou para a grande mídia é a da não-notícia – sobre esse conceito clique aqui.

O jornal "O Globo" deu a manchete (“Planalto altera perfil de jornalistas com críticas e mentiras”) e a "TV Globo" repercutiu nos seus telejornais durante todo o dia a “notícia” de que os perfis dos jornalistas Carlos Alberto Sardenberg e Miriam Leitão na enciclopédia virtual foram alterados com o objetivo de criticá-los. E o IP (endereço virtual) de onde partiram as alterações era da rede do Palácio do Planalto.

As supostas “críticas” inseridas no perfil dos jornalistas qualificam as análises e previsões econômicas de Miriam Leitão como “desastrosas” e de ter defendido “apaixonadamente” os ex-banqueiro Daniel Dantas quando foi preso pela Polícia Federal em escândalo de crimes contra o patrimônio público. E o jornalista Sardenberg de ser crítico à política econômico do governo por ter um irmão economista da Febraban que tem interesse em manter os juros altos no Brasil.


Jimmy Walles: Wikipédia não é apropriada como fonte primária

Três características chamam a atenção nessa segunda detonação seguida de uma bomba semiótica da não-notícia (a anterior foi a tentativa de transformar a existência do media trainning na Petrobrás em escândalo político): a irrelevância, o timming e o tautismo.

Wikipédia é relevante?

Como a própria Wikipédia já admitiu, a enciclopédia não deve ser utilizada como fonte primária de investigação (“Wikipedia Reasearching With Wikipedia”). Jimmy Walles, co-fundador da Wikipedia, afirmou que “enciclopédias de qualquer tipo não são apropriadas como fontes primárias, e não devem ser invocadas como autoridades”.

Pelo seu caráter colaborativo onde qualquer usuário pode alterar o conteúdo dos verbetes, o uso da Wikipédia não é aceito em escolas e universidades. No máximo, é utilizada como indicadora para fontes externas. Mas, repentinamente, para a grande mídia, a Wikipédia passou a ter uma surpreendente relevância como documento primário de investigação.

Como “dar pernas” à não-notícia?

Estamos na típica situação jornalística em que se tenta “dar pernas” para a notícia que, em si, não possui relevância. A melhor forma de dar algum gás à não-notícia é por meio da retórica da ambiguidade.


A matéria do jornal "O Globo" ora fala que o IP era da “Presidência da República”, ora do “Palácio do Planalto”, ou também de “computadores do Palácio” e “IP da Presidência” para, no final, diluir tudo no “endereço geral do servidor da rede sem fio do Palácio do Planalto”. Naturalmente, o teaser é dado pela manchete e primeiro parágrafo que tentam aproximar ao máximo o fato (irrelevante em si mesmo) da figura da presidente da República. Se o leitor persistir a leitura até o final da matéria, perceberá a diluição do próprio impacto noticioso.

Qual a matéria-prima dessa suposta notícia? De um lado, a própria enciclopédia virtual que é até cautelosa consigo mesma, e do outro uma rede wi-fi pública. Com isso se projeta a possibilidade de que, se alguém alterar o perfil do governador Geraldo Alckimin em rede wi-fi pública instalada pela prefeitura de São Paulo, o gabinete do prefeito seria responsabilizado... A matéria abre uma surreal possibilidade de um tipo de jornalismo que se basearia exclusivamente em fontes primárias de investigação onde o próprio repórter pode criar para turbinar a sua pauta.

O timming do escândalo

Outra coisa que chama a atenção é o timming da detonação dessa bomba semiótica. Supostamente o “fato” teria ocorrido nos dias 10 e 13 de maio [de 2013] e somente agora é “revelado”. Desde então, os perfis da Wikipédia encontravam-se alterados, sem haver qualquer tipo de escandalização – o que demonstra a “relevância” da enciclopédia virtual. Nesse momento, outras bombas semióticas estavam em andamento na Operação Anti-Copa (manifestações de rua, Black blocs etc.). A não-notícia foi guardada no paiol de armas semióticas da grande mídia, aguardando o momento propício para a detonação, que acabou sendo na sequência da suposta fraude da CPI da Petrobrás.


Enquanto havia manifestações anti-Copa, as não-notícias não eram necessárias

E para turbinar a não-notícia dos “perfis fraudados” da Wikipédia (como pode haver “fraude” se a enciclopédia é colaborativa?), a manjada estratégia da chamada "agenda setting" que até aqui o Governo federal mantêm-se inacreditavelmente refém: a não-notícia é repercutida pela imprensa ao “noticiar” que políticos de oposição pedem que a Procuradoria Geral da República apure a “denúncia”; ou divulgando a “preocupação” de órgãos como Associação Brasileira de Imprensa, Associação Nacional de Jornais e Federação Nacional dos Jornalistas.

O que exige uma resposta institucional da Secretaria de Comunicação do Governo, dando legitimidade e combustível à não-notícia da “fraude da Wikipédia”.


Estrelas do jornalismo global entregues ao sacrifício?

Um escândalo tautista

Outra característica dessa não-notícia é que ela revela não só o desespero da grande mídia em ter que continuamente rebocar um oposição política inepta como também o próprio tautismo das "Organizações Globo". Por tautismonos referíamos, em postagem anterior, a um momento de crise que a "Globo" enfrenta revelada por uma combinação de tautologia com autismo, por meio do conteúdo da sua programação cada vez mais autorreferencial e metalinguístico – sobre isso, clique aqui.


Quando a emissora oferece as próprias estrelas do seu jornalismo como supostas vítimas no script de uma não-notícia (repare na matéria do "Jornal Nacional" como o depoimento de Miriam Leitão foi feito com a câmera pegando-a de cima para baixo para reforçar a ideia de vitimização e fragilidade), é que estamos diante de uma situação análoga ao caso de um indivíduo que, sob condições extremas de fome ou de alteração do metabolismo basal, o corpo começa a entrar em processo catabólico (processo de degradação onde o corpo começa a consumir seu próprio tecido muscular).

Essa autofagia da "TV Globo" pode ser percebida nessas seguintes características que tornam a não-notícia da “fraude da Wikipédia” num exemplar caso de tautismo global:

(a) ao colocar seus próprios jornalistas como vítimas de uma armação cibernética, a "Globo" insere essa não-notícia na sua tradicional linha editorial de criminalizar a Internet. Em geral, nos seus telejornais, a Internet é pautada em seus aspectos negativos e difamatórios (crimes, vício, fraude etc.). Afinal, a mídia digital é o grande vilão da crise de audiência da TV aberta e concorrente direto da mídia tradicional.

(b) A insólita edição do "Jornal Nacional" do dia 08/08 onde um repórter entrevista outro jornalista da própria emissora, acaba revelando uma situação comum na cobertura de eventos extensivos como Copa do Mundo e Olimpíadas: na falta de assunto, jornalistas entrevistam-se entre si. No atual cenário eleitoral com uma frágil oposição política, a grande mídia começa a consumir a si mesma ao oferecer seus próprios integrantes como matéria-prima das bombas semióticas.

(c) Essa não-notícia revela também ser nostálgica: reviver os antigos fantasmas da censura, do controle da Imprensa por governos autoritários e toda a mitologia da extinta Guerra Fria – as supostas ditaduras comunistas como a cubana onde não há liberdade de imprensa e os jornalistas críticos são perseguidos.

(d) O episódio guarda uma impagável ironia com a jornalista Miriam Leitão. No meio jornalístico ela é conhecida como “urubóloga” por suas apocalípticas previsões para o País que nunca acontecem e pela forma como gagueja e engole seco quando é obrigada a dar notícias econômicas positivas nos telejornais da "TV Globo". A “fraude” do verbete “Miriam Leitão” revela essa fina ironia autorrealizadora: numa suprema metalinguagem, a emissora brinca com a própria notoriedade pública da sua jornalista."


FONTE: escrito por Wilson Roberto Vieira Ferreira no "Jornal GGN"  (http://jornalggn.com.br/blog/wilson-ferreira/o-escandalo-da-wikipedia-e-a-autofagia-da-tv-globo-por-wilson-ferreira).

COMPLEMENTAÇÃO

Governo tucano difama Raul Seixas na Wikipédia


Por Miguel do Rosário


A manchete é irônica. Mas segue rigorosamente a lógica da "Globo", cuja manchete foi essa:



E não é mentira, por incrível que pareça.

A rede pública do governo de São Paulo, através da "Companhia de Processamento de Dados do Estado de S Paulo" (Prodesp), foi usada para a realização de centenas de alterações no Wikipédia (clique aqui para ver a lista).

Inclusive, chamar nosso querido Raulzito de homossexual. O que não é nenhum xingamento, apenas uma calúnia grosseira, visto que ele foi casado diversas vezes, com mulheres.

Só para constar: o governo de São Paulo é administrado pelo PSDB de Aécio Neves, principal adversário de Dilma Rousseff nas eleições presidenciais deste ano.





A mentira sobre Raul Seixas, acrescentada à sua página na Wikipédia foi essa:

Raul foi considerado homossexual, por caos [sic] que teve com Cazuza, e também foi considerado “Maluco” por dizer que avistou uma nave espacial quando estava fazendo fezes em seu banheiro, em sua fazenda. A banda Pedra Letícia gravou uma música chamada “Eu não toco Raul” pois todas as pessoas pediam as músicas do Raul em seus shows.”

Convenhamos que é muito pior do que alterar a página da Miriam Leitão na Wikipédia, acrescentando a informação de que suas “análises são desastrosas”.

A rede da "Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo", uma rede pública, governamental, também foi usada para fazer uma alteração no perfil de Dilma Rousseff, mas a mudança foi cancelada.



Na verdade, o escândalo é uma farsa. A "Globo" explorou a característica tipicamente brasileira, presente em todas as grandes redes públicas, de não exercer nenhum tipo de controle sobre o uso da internet.

No caso do Palácio do Planalto, a sua rede de internet podia ser acessada por qualquer um, dentro do prédio ou nas proximidades.

Importante observar que qualquer um pode alterar mudanças na wikipédia. Não é preciso nenhuma tecnologia de governo para fazer isso.

O governo de Minas Gerais também, através da "Companhia de Tecnologia de Informação de Minas Gerais" (Prodemge), fez dezenas de mudanças em páginas da Wikipédia, como se pode observar clicando aqui.

Alguém usando a rede do Prodemge participou de uma discussão sobre a Satiagraha, só que eu preferi não dar destaque porque não consegui entender se é contra ou a favor a operação da Polícia Federal que prendeu Daniel Dantas (clique aqui para conferir você mesmo).

O IP do governo de Minas:



Mesmo sendo leigo em programação, eu achei com relativa facilidade esses dados na internet. Com um pouco de esforço, ver-se-á que praticamente todas as grandes redes públicas de internet, do Palácio do Planalto, dos palácios estaduais de governo, das prefeituras, das estatais, são usadas livremente por servidores, visitantes, jornalistas etc.

Agora, a "Globo" foi maliciosa. Ela fez um tremendo escarcéu, sem explicar nada, depois ligou para a ABI, cujos membros têm idade média acima dos 80 anos, e lhes fez perguntas agressivas sobre a matéria. Como o presidente da ABI provavelmente nunca ouviu falar em IP, ele passa a acreditar que a própria presidenta ou algum assessor diabólico usou uma tecnologia especial, importada da Coréia do Norte, para alterar criminosamente a Wikipédia de Miriam Leitão e Sardenberg. O presidente da ABI também não deve saber o que é Wikipedia. Então ele faz declarações bombásticas, sobre “práticas da ditadura”, como se o governo tivesse alterado um verbete na Enciclopédia Britânica.

Qualquer um pode alterar, a qualquer momento, qualquer verbete na Wikipedia.

A mudança pode ter sido feita por um servidor, por um prestador de serviço, por um visitante, por um dos jornalistas que frequentam a sala de imprensa do Planalto.

Por exemplo, eu estive no Palácio do Planalto, junto com pessoas do Brasil inteiro (jornalistas, blogueiros, hackers, editores, ativistas etc) para um debate público, transmitida ao vivo, com Gilberto Carvalho. Tive acesso à senha de wifi do Palácio. Poderia ter sido eu a mexer no verbete do Sardenberg. Só que eu estive por lá este ano, a mudança ocorreu em 2013.

Lembro-me que todos tinham acesso à senha do Palácio. Era liberado.

A desonestidade da mídia abandonou todos os escrúpulos. Fernando Rodrigues, editorialista da "Folha", escreve texto furibundo contra o “Estado aparelhado”. Só quero ver se ele vai defender Raul Seixas contra os ataques que sofreu de alguém usando a rede pública do Estado de São Paulo, que é sustentado pelos impostos dele.

Quem vai ligar para as ex-mulheres de Raul, para seus amigos, ou repercutir a matéria junto aos fãs do roqueiro?

Quem vai acusar o governo de São Paulo de usar “práticas da ditadura nazista”?

"O Globo" publicou sábado editorial raivoso, intitulado “Aloprados agora atacam do Planalto”, imprecando contra “sites / blogs chapa-brancas, sustentados com dinheiro público”. A Vênus está com obsessão por blogs, porque eles a estão desmascarando.

Aproveito para avisar que um passarinho contou-me que a íntegra do processo de sonegação da Globo – com milhares de páginas – está pintando a qualquer momento por aí.

E ainda tenta mostrar os blogs como corruptos, por receber “dinheiro público”. Ora, dentre centenas de blogs, apenas alguns recebem – merecidamente – publicidade institucional.

Quem é a "Globo" para falar em “dinheiro público”? Mostra o DARF primeiro!

Eu [blog "Tijolaço" e "O Cafezinho"] nunca recebi um centavo de verba pública. E critico duramente o governo em sua política de comunicação, por permitir, com sua omissão, que a mídia nos ataque dessa maneira.

Se houvesse uma política de estado, republicana, pela qual sites e blogs de todas as cores ideológicas, cadastrados junto à SECOM, recebessem de acordo com a sua visitação, não estaríamos nessa situação ridícula.

Situação ridícula de sermos a todo momento atacados pela "Globo", que, ela sim, recebe bilhões de reais de recursos públicos por ano. Está tudo lá, na internet.

É revoltante ser chamado de bêbado sem nunca ter posto uma gota de álcool na boca.

O caso do Raulzito, para mim, é muito pior do que as críticas à Miriam Leitão, que são fúteis.

Ela é viva, rica e pode se defender. Tem espaço ilimitado em concessões públicas, como a "TV Globo" e rádios, afora a "Globonews", jornais, revistas, internet. Pode até publicar um novo livrinho infantil atacando o governo, se achar conveniente.

Raulzito morreu quase na miséria e não pode mais se defender.

A nossa mídia tem que aprimorar sua pontaria, porque essas balas de prata estão atingindo seus próprios pés."

FONTE da complementação:
escrito pelo jornalista Miguel do Rosário no blog "Tijolaço"  (http://tijolaco.com.br/blog/?p=19889). [Trechos entre colchetes adicionados por este blog 'democracia&política'].

Um comentário:

Unknown disse...

E a Dilma ainda cai nessa! É muito fraca!