segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Explosão na direita? “DIRCEU FOI CONDENADO SEM PROVAS”, diz Ives Gandra (Por quê !?!)


O JURISTA AFIRMA QUE O JULGAMENTO ABRE ESPERANÇA DE PUNIÇÃO A CORRUPTOS, MAS CRIA 'INSEGURANÇA JURÍDICA MONUMENTAL'

Por Mônica Bergamo, colunista do jornal tucano “Folha”

“O ex-ministro José Dirceu foi condenado sem provas. A teoria do "domínio do fato" foi adotada de forma inédita pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para condená-lo.

Sua adoção traz uma insegurança jurídica "monumental": a partir de agora, mesmo um inocente pode ser condenado com base apenas em presunções e indícios.

Quem diz isso não é um petista fiel ao principal réu do mensalão. E sim o jurista Ives Gandra Martins, 78, que se situa no polo oposto do espectro político e divergiu "sempre e muito" de Dirceu.

Com 56 anos de advocacia e dezenas de livros publicados, inclusive em parceria com alguns ministros do STF, Gandra, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, diz que o julgamento do escândalo do mensalão tem dois lados.

Um deles é positivo: abre a expectativa de "um novo país" em que políticos corruptos seriam punidos.

O outro é ruim e perigoso, pois a corte teria abandonado o princípio fundamental de que a dúvida deve sempre favorecer o réu.

-Folha - O senhor já falou que o julgamento teve um lado bom e um lado ruim. Vamos começar pelo primeiro.

Ives Gandra Martins - O povo tem um desconforto enorme. Acha que todos os políticos são corruptos e que a impunidade reina em todas as esferas de governo. O mensalão como que abriu uma janela em um ambiente fechado para entrar o ar novo, em um novo país em que haveria a punição dos que praticam crimes. Esse é o lado indiscutivelmente positivo. Do ponto de vista jurídico, eu não aceito a "teoria do domínio do fato".

-Por quê?

Com ela, eu passo a trabalhar com indícios e presunções. Eu não busco a verdade material. Você tem pessoas que trabalham com você. Uma delas comete um crime e o atribui a você. E você não sabe de nada. Não há nenhuma prova senão o depoimento dela --e basta um só depoimento. Como você é a chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está condenada, "você deveria saber". Todos os executivos brasileiros correm agora esse risco. É uma insegurança jurídica monumental. Como um velho advogado, com 56 anos de advocacia, isso me preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no Supremo foi a do "in dubio pro reo" [a dúvida favorece o réu].

-Houve uma mudança nesse julgamento?

O "domínio do fato" é novidade absoluta no Supremo. Nunca houve essa teoria. Foi inventada, tiraram de um autor alemão, mas também na Alemanha ela não é aplicada. E foi com base nela que condenaram José Dirceu como chefe de quadrilha [do mensalão]. Aliás, pela "teoria do domínio do fato", o maior beneficiário era o presidente Lula, o que vale dizer que se trouxe a teoria pela metade.

-O "domínio do fato" e o "in dubio pro reo" são excludentes?

Não há possibilidade de convivência. Se eu tiver a prova material do crime, eu não preciso da "teoria do domínio do fato" [para condenar].

-E no caso do mensalão?

Eu li todo o processo sobre o José Dirceu, ele me mandou. Nós nos conhecemos desde os tempos em que debatíamos no programa do Ferreira Netto na TV [na década de 1980]. Eu me dou bem com o Zé, apesar de termos divergido sempre e muito. Não há provas contra ele. Nos embargos infringentes, o Dirceu dificilmente vai ser condenado pelo crime de quadrilha.

-O "in dubio pro reo" não serviu historicamente para justificar a impunidade?

Facilita a impunidade se você não conseguir provar, indiscutivelmente. O Ministério Público e a polícia têm que ter solidez na acusação. É mais difícil. Mas eles têm instrumentos para isso. Agora, num regime democrático, evita muitas injustiças diante do poder. A Constituição assegura a ampla defesa --"ampla" é adjetivo de uma densidade impressionante. Todos pensam que o processo penal é a defesa da sociedade. Não. Ele objetiva fundamentalmente a defesa do acusado.

-E a sociedade?

A sociedade já está se defendendo tendo todo o seu aparelho para condenar. O que nós temos que ter no processo democrático é o direito do acusado de se defender. Ou a sociedade faria justiça pelas próprias mãos.

-Discutiu-se muito nos últimos dias sobre o clamor popular e a pressão da mídia sobre o STF. O que pensa disso?

O ministro Marco Aurélio [Mello] deu a entender, no voto dele [contra os embargos infringentes], que houve essa pressão. Mas o próprio Marco Aurélio [quando não se trata de PT] nunca deu atenção à mídia. O [ministro] Gilmar Mendes nunca deu atenção à mídia, sempre votou como quis. Eles estão preocupados, na verdade, com a reação da sociedade. Nesse caso, se discute, pela primeira vez no Brasil, em profundidade, se os políticos desonestos devem ou não ser punidos. O fato de ter juntado 40 réus e se transformado num caso político tornou o julgamento paradigmático: vamos ou não entrar em uma nova era? E o Supremo sentiu o peso da decisão. Tudo isso influenciou para a adoção da "teoria do domínio do fato".

-Algum ministro pode ter votado pressionado?

Normalmente, eles não deveriam. Eu não saberia dizer. Teria que perguntar a cada um. É possível. Eu diria que, indiscutivelmente, graças à televisão, o Supremo foi colocado numa posição de muitas vezes representar tudo o que a sociedade quer ou o que ela não quer. Eles estão na verdade é na berlinda. A televisão põe o Supremo na berlinda. Mas eu creio que cada um deles decidiu de acordo com as suas convicções pessoais, em que pode ter entrado, inclusive, convicções também de natureza política.

-Foi um julgamento político?

Pode ter alguma conotação política [partidária]. Aliás, o Marco Aurélio deu bem essa conotação. E o Gilmar também. Disse que esse é um caso que abala a estrutura da política. Os tribunais do mundo inteiro são cortes políticas também, no sentido de manter a estabilidade das instituições. A função da Suprema Corte é menos fazer justiça e mais dar essa estabilidade. Todos os ministros têm suas posições, políticas inclusive.

-Isso conta na hora em que eles vão julgar?

Conta. Como nos EUA conta. Mas, na prática, os ministros estão sempre acobertados pelo direito. São todos grandes juristas.

-Como o senhor vê a atuação do ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso?

Ele ficou exatamente no direito e foi sacrificado por isso na população. Mas foi mantendo a postura, com tranquilidade e integridade. Na comunidade jurídica, continua bem visto, como um homem com a coragem de ter enfrentado tudo sozinho.

-E Joaquim Barbosa?

É extremamente culto. No tribunal, é duro e às vezes indelicado com os colegas. Até o governo Lula, os ministros tinham debates duros, mas extremamente respeitosos. Agora, não. Mudou um pouco o estilo. Houve uma mudança de perfil.

-Em que sentido?

Sempre houve, em outros governos, um intervalo de três a quatro anos entre a nomeação dos ministros. Os novos se adaptavam à tradição do Supremo. Na era Lula, nove se aposentaram e foram substituídos. A mudança foi rápida. O Supremo tinha uma tradição que era seguida. Agora, são 11 unidades decidindo individualmente.

-E que tradição foi quebrada?

A tradição, por exemplo, de nunca invadir as competências [de outro poder] não existe mais. O STF virou um legislador ativo [pró-direita]. Pelo artigo 49, inciso 11, da Constituição, Congresso pode anular decisões do Supremo. E, se houver um conflito entre os poderes, o Congresso pode chamar as Forças Armadas. É um risco que tem que ser evitado. Pela tradição, num julgamento como o do mensalão, eles julgariam em função do "in dubio pro reo". Pode ser que reflua e que o Supremo volte a ser como era antigamente. É possível que, para outros julgamentos [que não tenham réus do PT], voltem a adotar a teoria do "in dubio pro reo"...
-Por que o senhor acha isso?

Porque a "teoria do domínio do fato" traz insegurança para todo mundo.”

FONTE: reportagem de Mônica Bergamo, no jornal tucano “Folha de São Paulo” (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/130274-dirceu-foi-condenado-sem-provas-diz-ives-gandra.shtml). [Título, imagem do Google e trechos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].


COMPLEMENTAÇÃO

GANDRA DEFENDEU A GLOBO? A FOLHA? Por que Yves Gandra inocenta Dirceu?




(O ansioso blogueiro –jornalista Paulo Henrique Amorim - nunca se iludiu com entrevista de um ultraconservador a uma “folha” ultraconservadora. Os dois conhecem a partitura. E a entrevistadora também).

“O portal ‘Conversa Afiada’ tem o prazer de publicar importante análise de amigo navegante, brilhante magistrado e agora advogado tributarista:

“Yves Gandra Martins é o maior advogado tributarista do Brasil, sem dúvida. E advogados tributaristas, como eu, defendemos em juízo aqueles que são acusados de terem transgredido normas fiscais.

Yves Gandra Martins deve ter dezenas, senão centenas de clientes, grandes empresários, que respondem a processos envolvendo delitos contra o fisco. Esses delitos preveem penas de prisão.

Se a teoria do “domínio do fato” persiste, seus clientes e muitos outros empresários (inclusive alguns clientes meus), correrão sério risco, como ele mesmo diz na sua entrevista.

Por exemplo, também a “Rede Globo”, agora ré confessa de [enorme] crime de sonegação fiscal, correrá sério risco.

Mas , como sabemos, as empresas não são julgadas por crimes. Mas sim os seus representantes legais.

Mesmo porque não foram os prédios, os computadores, os móveis da “Rede Globo” que terão sonegado nada. Nem falsificado documentos, gerado contratos frios, movido fortunas para paraísos fiscais.

A empresa “Rede Globo”, em si, não pode ser responsabilizada criminalmente. Mas sim aqueles indivíduos, pessoas físicas, que a fizeram incorrer no crime de sonegação.

Assim, se a teoria do “domínio do fato” subsistir válida, gerará jurisprudência. E então, os Irmãos Marinho ( aqueles que não têm nomes, como você diz) não poderão mais dizer que “eles não sabiam de nada”. E nem deixar seus contadores pagarem sozinhos pelo crime, nem seus advogados, assessores fiscais etc.

Afinal, segundo Joaquim Barbosa e seu círculo de Ministros Seguidores, todos advogados como eu fui, que trabalham hoje no “Supremo Tribunal de Exceção Federal”, eles , os Irmãos Marinhos tinham “domínio do fato” de que a “Rede Globo” estava sonegando soma equivalente hoje a 1 bilhão de reais.

Ponto.

E irão, com absoluta certeza, ser condenados, um dia.

Atente, amigo Paulo Henrique e seus esclarecidos leitores para o fato de que os Irmãos Marinho não poderão contar com embargos infringentes, já que terão sido julgados em, pelo menos, duas instancias (na Justiça Federal no Rio de Janeiro, no TRF do Rio e no STF).

Mas não irão parar por aí os problemas daqueles que bateram palmas para as condenações pela “teoria do domínio do fato”.

O caso do “mensalão mineiro” [mensalão do PSDB], todo envolvendo dinheiro publico da CEMIG e de vários órgãos estaduais aqui de Minas, se a teoria do domínio do fato persistir válida, vai ter efeito ainda mais devastador sobre os responsáveis, todos do alto escalão do PSDB e do DEM.

Também o caso das propinas admitidas nas concorrências do metrô de São Paulo, (e que já foram confessadas pela empresa alemã SIEMENS à Justiça) irá, um dia, bater às portas do STF, pois existiram verbas federais envolvidas.

E uma vez que o “domínio total do fato” pelos governadores Mário Covas, José Serra e Geraldo Alkmin é mais do que notório, a menos que a teoria do “domínio do fato”, (que não é aplicada em nenhum tribunal do mundo), não prevaleça, nossos filhos e netos, com certeza, irão contar que viram donos da maior rede de TV do mundo e ex-governadores do maior estado do Brasil sendo presos.

Junto com vários clientes do Yves Granda Martins.

E alguns clientes meus, inclusive.”

(“Desembargador Aposentado”, mas ainda advogando)

FONTE da complementação: portal “Conversa Afiada”  (http://www.conversaafiada.com.br/brasil/2013/09/23/gandra-defendeu-a-globo-a-folha/).

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