sábado, 28 de julho de 2012

O MERCOSUL NA SUA SEGUNDA GERAÇÃO


“A entrada da Venezuela coloca o MERCOSUL em novo estágio. O bloco fica ampliado nas dimensões econômicas, comerciais, culturais e demográficas. Territorialmente, incorpora mais de 900 mil quilômetros quadrados, que é, praticamente, as superfícies de França e Alemanha somadas. Consolida o domínio sobre as maiores reservas energéticas, minerais, naturais e de recursos hídricos do planeta. A partir de agora, o MERCOSUL passa a ser a região com a maior reserva mundial de petróleo.

Por Jeferson Miola

No último 13 de julho, o Governo da Venezuela formalizou na Secretaria do Mercosul o "Instrumento de Ratificação do Protocolo de Adesão da República Bolivariana da Venezuela ao Mercosul", assinado em 04 de julho de 2006. Dessa forma, o país cumpre as formalidades para seu ingresso pleno no bloco, passando da condição de "Membro Associado" à qualidade de "Estado Parte".

O ingresso da Venezuela foi aprovado pelas Presidentas Cristina Kirchner, da Argentina, Dilma Rousseff, do Brasil e pelo Presidente José Mujica, do Uruguai, na "Cúpula Presidencial de 29 de junho de 2012", na cidade argentina de Mendoza.

O Mercosul nasceu num contexto histórico e político muito diferente do atual. Menem governava a Argentina, Collor o Brasil, Andrés Rodriguez o Paraguai e Alberto Lacalle presidia o Uruguai. Era o auge da fanfarra neoliberal e das promessas da globalização financeira que, supostamente, levariam a humanidade a um nirvana que, na verdade, se converteu num tremendo pesadelo. Em 1991, a constituição do “Mercado Comum do Sul” visava coordenar políticas macroeconômicas e de liberalização comercial no marco de uma inserção desfavorável à globalização neoliberal.

O epicentro daquele Mercosul idealizado em 1991 eram as relações comerciais e a coordenação dos interesses das megaempresas transnacionais e dos monopólios econômicos na maximização dos lucros auferidos regionalmente para a transferência às suas matrizes, radicadas sobretudo na Europa e nos Estados Unidos.

Em 2012, esse projeto de integração completou 21 anos, marcado por limites e contradições; mas, também, exibindo avanços em diversos campos. Desde 2003, a partir da assunção de governos de esquerda e progressistas na região, notadamente sob a liderança inicial de Kirchner e Lula, a fisionomia do Mercosul vem sendo transformada.

O comércio intrabloco passou de 4,5 para 50 bilhões de dólares anuais; foi criado um Parlamento próprio; 100 milhões de dólares ao ano são aplicados pelo FOCEM [Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul] a fundo perdido na execução de investimentos sociais e de infraestrutura para diminuir as assimetrias e disparidades entre os países; está sendo implementado um Estatuto da Cidadania, e a “integração antiCondor” converteu as políticas de direitos humanos adotadas no MERCOSUL em paradigma mundial.

A entrada da Venezuela significa o aprofundamento dessa transformação, e coloca o Mercosul em novo estágio. O bloco fica ampliado nas dimensões econômicas, comerciais, culturais e demográficas. Territorialmente, incorpora mais de 900 mil quilômetros quadrados, que é, praticamente, as superfícies de França e Alemanha somadas. Consolida a jurisdição e o domínio sobre as maiores reservas energéticas, minerais, naturais e de recursos hídricos do planeta. Seguramente, deverá ter maior protagonismo no jogo geopolítico internacional.

A ampliação do Mercosul, naturalmente, será acompanhada de dificuldades, mas também de inúmeras conveniências. Contribui para maior coesão da região, para a estabilidade democrática, para a diminuição de conflitos e aumenta a segurança e a capacidade de defesa. A maior integração também conforma ambiente comunitário mais favorável à adoção de estratégias comuns de desenvolvimento, aproveitando o mercado regional de massas incrementado em 29 milhões de pessoas e um comércio intraregional de produtos manufaturados com maior valor agregado. A partir de agora, o Mercosul passa a ser a região do globo com a maior reserva mundial de petróleo, adquirindo maior poder de influência na definição das políticas energéticas no mundo.

Desde a assinatura do "Tratado de Assunção" em 1991, dois acontecimentos marcaram uma inflexão geopolítica e estratégica do Mercosul numa perspectiva pós-neoliberal. O primeiro deles foi o sepultamento, em 2005, da "Área de Livre Comércio das Américas", a ALCA, que representava perigosa ameaça à soberania, ao desenvolvimento e à independência dos países do hemisfério. O segundo acontecimento marcante está se dando justo neste momento, com o ingresso pleno da Venezuela no Bloco, inaugurando o que se poderia considerar como a segunda geração do MERCOSUL e do processo de integração regional.

A América do Sul foi historicamente prejudicada pelas grandes potências - especialmente pelos Estados Unidos - que preferem nosso rico e promissor continente dividido – ou desunido – a um continente integrado e capaz de construir soberanamente seu destino. Essa realidade faz compreender as razões do conservadorismo que combate - por vezes de forma irascível - o ingresso da Venezuela no Mercosul e o fortalecimento dos laços regionais de amizade, de harmonia e de integração.

O crescimento do Mercosul poderá ser fator de estímulo para o ingresso de outros países nesta comunidade, que já examina com o Equador as condições para sua adesão. A unidade regional, que já é física devido à contiguidade territorial, poderá assumir características de integração mais avançada, abrangendo tanto aspectos comerciais e econômicos, como sociais, culturais e políticos. Isso propiciará melhor posicionamento estratégico e geopolítico da região no mundo, o que será benéfico para cada país individualmente e para o conjunto das nações no enfrentamento dos problemas e na defesa de interesses que são comuns a elas.

O Mercosul altivo e motorizando o fortalecimento da América do Sul é a melhor contribuição que o continente pode dar à paz e à igualdade no mundo. Constitui resposta eficiente à prolongada crise do capitalismo mundial, protegendo as conquistas sociais e econômicas logradas na última década pelos atuais Governos da região dos avanços da sanha neoliberal que, na Europa, trata do desmonte do Estado de Bem-Estar social em nome da austeridade fiscal e da proteção dos interesses da especulação financeira.”

FONTE: escrito por Jeferson Miola, diretor da Secretaria do MERCOSUL em Montevidéu. Transcrito no site “Carta Maior”  (http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20623).

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