sábado, 7 de janeiro de 2012

Emir Sader: O MUNDO DO DINHEIRO E SEUS HERÓIS


Por Emir Sader

Até certo momento, os ricos ou escondiam sua riqueza ou tratavam de passar despercebidos, como se não ficasse bem exibir riqueza em sociedades pobres e desiguais. Ou até, também, para escapar da Receita.

De repente, o mundo neoliberal - esse em que tudo vale pelo preço que tem, em que tudo tem preço, em que tudo se vende, tudo se compra – passou a exibir a riqueza como atestado de competência. Nos EUA, se deixou de falar de pobres, para falar de “fracassados”. Numa sociedade que se jacta de dar oportunidade para todos, numa “sociedade livre, aberta”, quem não deu certo economicamente é por incompetência ou por preguiça.

Ser rico é ter dado certo, é demonstrar capacidade para resolver problemas, ter criatividade, se dar bem na vida etc., etc. Até certo momento. as biografias que se publicavam eram de grandes personagens da historia universal – governantes, líderes populares, gênios musicais, detentores de grandes saberes. A partir do neoliberalismo, as biografias de maior sucesso passaram as ser as dos milhardários, que supostamente ensinam o caminho das pedras para os até ali menos afortunados.

Todos dizem que nasceram pobres, subiram na vida graças à tenacidade, à criatividade, ao trabalho duro, ao espírito de sacrifício. Tiveram tropeços, mas não desistiram, leram algum guru de autoajuda que os fez aumentarem sua autoestima, acreditarem mais em si mesmos, recomeçarem do zero, até chegarem ao sucesso indiscutível.

Seus livros se transformam em ‘best-sellers’, vendem rapidamente – até que vários deles caem em desgraça, porque flagrados em algum escândalo -, eles viajam o mundo dando entrevistas e vendendo seu saber que, se fosse seguido por seus leitores, produziria um mundo de ricos e de pessoas realizadas e felizes como eles.

Quem vai publicar um livro de um “fracassado”? Só mesmo se fosse para que as pessoas soubessem quais os caminhos errados, aqueles que não deveriam seguir, se querem ser ricos, bonitos e felizes. O mundo do trabalho, da fábrica, do sindicato, dos movimentos de bairro, das comunidades – mundo marginal e marginalizado.

Programas de televisão exaltam os ricos, os bem-sucedidos, as mulheres que exibem sua elegância, sua falta de pudor de gastar milhões na Daslu e nas viagens a Nova York e a Paris. Ninguém quer ver gente feia, pobre, desamparada, que só frequenta os noticiários policiais e de calamidades naturais. As telenovelas têm como cenários os luxuosos apartamentos da zona sul do Rio e dos jardins de São Paulo, com belas mulheres e homens que não trabalham, no máximo administram empresas de sucesso. Os pobres giram em torno deles – empregadas domésticas, entregadores de pizza, donos de botecos -, sempre como coadjuvantes do mundo dos ricos, que propõem o tipo de vida que as pessoas deveriam ter, se quiserem ser ricos, bonitos, felizes.

Esse mundo fictício esconde os verdadeiros mecanismos que geram a riqueza e a pobreza, os meios sociais – os bancos por um lado, as fábricas por outro – em que se geram a riqueza e a fortuna, a especulação e a expropriação do trabalho alheio. Em que estão os vilões e os heróis das nossas sociedades.”

FONTE: escrito por Saul Leblon no site “Carta Maior”  (http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=856).

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