quinta-feira, 19 de agosto de 2010

PEDIDO DE PATENTE PASSA A SER ESTRATÉGICO PARA EMBRAER

“As empresas brasileiras do setor aeroespacial e de defesa têm aumentado o uso de patentes para a proteção de direitos sobre inovações tecnológicas, processo que até 2006 praticamente não existia.

Na Embraer, por exemplo, a maior empresa do setor e a terceira do mundo no segmento de aviação comercial, registrou menos de 10 patentes em quase 40 anos de existência. A partir de 2006, no entanto, mudou a sua estratégia ao criar uma área só para cuidar do tema da propriedade intelectual e, desde então, já contabiliza um total de 70 patentes pleiteadas e outros 170 pedidos de extensão para outros países.

"A empresa precisa proteger o seu patrimônio intangível e a utilização de patentes é uma das formas que ela tem para se assegurar de que não está infringindo a patente de terceiros ou qualquer outro tipo de regulamento internacional que possa afetar a operação dos seus aviões", disse o gerente de Programa de Desenvolvimento Tecnológico da companhia, Francisco Ferreira Gomes Filho, que participou de um workshop sobre o tema das patentes, semana passada, em São José dos Campos (SP).

Ao disseminar a cultura da proteção do conhecimento, segundo Gomes Filho, a empresa também está valorizando o processo criativo da sua força de trabalho e estimulando ainda mais a inovação dos seus engenheiros, que veem na patente uma forma de reconhecimento do trabalho inovador. "A Embraer avalia a necessidade de uma patente com base em sua estratégia de negócios. Às vezes é mais vantajoso que determinado conhecimento seja mantido em sigilo, principalmente quando a exposição de detalhes do projeto representa um risco para a empresa", explica.

Historicamente, as empresas do setor aeroespacial e de defesa no Brasil não privilegiam o uso de patentes para a proteção de direitos sobre inovações tecnológicas, e o segredo industrial sempre foi a principal forma de proteção do valor criado.

O Instituto Tecnológico de aeronáutica (ITA) [do Comando da Aeronáutica], principal reduto da tecnologia aeroespacial do país, registrou apenas seis patentes entre os anos de 1984 e 1998, de acordo com dados do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). A partir de 2002 até o ano passado, o total de patentes registradas pelo Instituto foi de 16, enquanto que universidades, como a Unicamp, têm em seu histórico um total de 591 patentes.

"A origem do problema está no desconhecimento e também na necessidade de rapidez. As empresas desse setor pensam que o processo de patentear custa muito dinheiro, utiliza uma carga administrativa muito grande e depois não sabem o que fazer com elas", explica Alejandro Klecker, principal executivo do grupo espanhol Clarke, Modet, uma das líderes mundiais na área de propriedade intelectual. O executivo alerta, no entanto, que se a empresa não tem propriedade intelectual, ela não existe no mercado internacional de tecnologia.

"A proteção do conhecimento já se tornou um indicador para justificar um investimento. Na Siemens, para cada US$ 500 mil de desenvolvimento tem de haver uma patente. O investidor quer saber para onde está indo o dinheiro do acionista".

O governo espanhol, segundo Klecker, só subvenciona o desenvolvimento que termina em patente. "Não somos nenhuma potência tecnológica para dedicarmos os poucos recursos que temos em investigação básica", comenta.

A Boeing, segundo levantamento feito pelo Centro para a Competitividade e Inovação do Cone Leste Paulista (CECOMPI), é a empresa no mundo com maior número de patentes depositadas (6.011) e também a que apresentou o maior crescimento do setor, com 170%, no período de 2000 a 2005. A Airbus aparece em segundo lugar, com 2.075 patentes e a Bombardier vem em terceiro, com 935. Durante esse período, a Embraer era titular de apenas seis patentes. Números mais recentes apurados junto ao INPI mostram que a Embraer registrou um total de 20 patentes no Brasil e mais 18 nos Estados Unidos.”

FALTA DE PROTEÇÃO INTELECTUAL DEIXA GRANDES FABRICANTES VULNERÁVEIS

A área de novos materiais, especialmente os compósitos (formados pela união de dois os mais materiais), segundo estudo feito pelo Centro para a Competitividade e Inovação do Cone Leste Paulista (CECOMPI), está entre as que mais registram pedidos de patentes nas empresas aeroespaciais. A Boeing, Airbus e Nasa aparecem entre os principais titulares de patentes sobre compósitos. "A aeronave militar A400M já tem um total de 500 patentes registradas e o A380 outras 1800", diz o principal executivo da Clarke, Modet, Alejandro Klercke.

"Outros fabricantes de aeronaves como a Embraer e a Bombardier encontram-se vulneráveis por ainda não dominarem as tecnologias de materiais com a mesma profundidade da Boeing e da Airbus, principalmente devido ao papel estratégico que os materiais ocupam hoje nos desenvolvimentos de aeronaves mais leves, econômicas e seguras", informa relatório do CECOMPI .

Para o ex-presidente da Embraer Ozires Silva, a proteção intelectual da inovação também pode se tornar um diferencial competitivo no mercado e por isso é estratégica para os negócios da empresa. "Na década de 80, a Embraer desenvolveu uma manete única para a aeronave Tucano e nós não registramos a patente. Logo depois a suíça Pilatus aplicou a solução em uma aeronave concorrente do Tucano."

De olho no potencial do mercado brasileiro de patentes, a Clarke vai investir no país. "Também vemos grandes possibilidades de negócios na área de transferência de tecnologia, setor que o Brasil tem pouca experiência, mas pode tirar muito proveito."

O executivo cita como exemplo o novo cargueiro militar KC-390, que a Embraer está desenvolvendo para a Força aérea Brasileira (FAB), e o programa de aquisição de caças F-X2. A Clarke faturou US$ 17,8 milhões em 2009 e espera chegar a US$ 20 milhões em 2010. No Brasil, ela tem hoje 56 funcionários.”

FONTE: reportagens de Virgínia Silveira publicadas (19/08) no jornal “Valor” e reproduzidas no site “DefesaNet”.

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