domingo, 30 de maio de 2010

QUEM TEM MEDO DO CRESCIMENTO?

Paulo Nogueira Batista Jr.

“Não faz muito tempo, prevalecia certo pessimismo sobre as perspectivas de crescimento do Brasil. A economia crescia pouco ou nada. Economistas influentes, aqui e no exterior, afirmavam que o nosso “crescimento potencial” era da ordem de 3% apenas.

Agora, como se sabe, a preocupação dominante é a oposta: a economia estaria aquecida demais. A maioria dos economistas, pelo menos daqueles que têm acesso à mídia, pede que o governo tome novas medidas para conter o ímpeto de expansão da economia.

Segundo algumas estimativas, o Brasil estaria crescendo em ritmo chinês, muito acima do nosso potencial. Um dos problemas da argumentação dos economistas, leitor, é que as estimativas de produto potencial ou capacidade produtiva máxima são, do ponto de vista técnico, muito incertas.

Muitos dos que sustentavam, há poucos anos, que o crescimento do nosso PIB potencial não passava de 3% já reviram para cima seus cálculos e admitem agora uma taxa da ordem de 4% ou mais. O staff do FMI, por exemplo, estima o crescimento potencial do Brasil em 4% a 4,5%. As técnicas de estimação do produto potencial se baseiam em parte nas taxas de crescimento observadas. As estimativas se adaptam, portanto, aos resultados que vão ocorrendo ao longo do tempo.

Tenho a impressão de que novas adaptações serão necessárias. Não me surpreenderia que, quando olharmos para trás, daqui a, digamos, cinco ou seis anos, o Brasil tenha crescido algo como 6% ao ano, em média — isso, claro, se não cometermos grandes erros de política econômica e não acontecer um agravamento dramático do quadro mundial.

Longe de mim descartar inteiramente os argumentos dos que temem um crescimento excessivo. Uma preocupação válida é a inflação. Outra é o risco de que uma expansão exuberante do crédito, alimentada por influxos de capital externo e outros fatores, leve à formação de bolhas nos mercados de ativos (bolsas, imóveis, câmbio).

Uma terceira, e talvez a mais relevante no caso brasileiro, é o desequilíbrio das contas externas.

No que diz respeito à inflação, não há por enquanto motivos para alarme.

As medidas de tendência da inflação, calculadas pelo Banco Central, estão subindo, mas não de forma dramática. A aceleração da inflação nos meses iniciais de 2010 se deve, em parte, a choques de oferta (chuvas e seus efeitos sobre os preços de alimentos, elevação dos preços das commodities no mercado mundial). As expectativas dos analistas de mercado, para os próximos 12 meses, não estão muito acima do centro da meta do Banco Central.

É verdade que esses mesmos analistas contam com uma alta adicional da taxa básica de juro. Por outro lado, parece razoável esperar que as medidas de contenção já tomadas pelo governo, nos campos monetário, creditício e fiscal, produzam alguma desaceleração da economia.

O mais preocupante talvez seja a contínua deterioração das contas externas.

O déficit em conta corrente, embora ainda inferior ao que foi nos 1990 e no início da década atual, tem aumentado de forma rápida. Também aqui não há motivo para alarme — as reservas internacionais do país estão em torno de US$ 250 bilhões e a nossa capacidade de atrair investimentos diretos estrangeiros, uma forma relativamente estável de capital, é bastante considerável.

Mas parece claro que a combinação de altas taxas de crescimento do PIB e valorização do real está levando a uma ampliação problemática do desequilíbrio externo — problemática sobretudo quando se considera a instabilidade da economia internacional.

São problemas típicos das fases de crescimento. O Brasil tem condições de continuar crescendo de forma rápida. Não deve se deixar inibir pelos que têm medo do crescimento. Mas precisa, por outro lado, garantir a sustentação do crescimento ao longo do tempo, o que implica, entre outras coisas, controlar a inflação, administrar com cuidado as contas externas e evitar a formação de desequilíbrios nos mercados de ativos.

FONTE: artigo escrito por Paulo Nogueira Batista Jr. E publicado no O Globo e no blog “Tijolaço”. O autor é diretor-executivo no FMI, onde representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago)

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