domingo, 17 de agosto de 2008

MONOPÓLIO DA COMUNICAÇÃO É OBSTÁCULO À DEMOCRATIZAÇÃO

O site Carta Maior postou ontem o texto de Maurício Thuswohl, abaixo transcrito, que aborda com propriedade o fato já evidente: há o império da imprensa no Brasil:

CONFERÊNCIA DA BAHIA

Participantes da 1ª Conferência de Comunicação Social da Bahia apontam o poder financeiro das grandes empresas de comunicação social no Brasil e a falta de vontade política para permitir mudanças como os principais entraves à democratização do setor.

SALVADOR – Todos aqueles que lutam pela efetiva democratização da comunicação social no Brasil sabem que têm pela frente um enorme obstáculo a transpor, pois o seleto grupo que controla os principais meios de comunicação do país não nutre a menor vontade política de efetuar qualquer mudança nas atuais regras do jogo, das quais são beneficiários históricos. Com muito dinheiro, influência no Congresso Nacional e no Judiciário e donas de um poder de penetração no imaginário nacional capaz de fazer e destruir reputações (e governos) em poucos dias, essas grandes empresas, ao menos por enquanto, encontram-se imunes às transformações democráticas que estão ocorrendo no país.

A busca por estratégias para enfrentar essa realidade foi o principal foco dos debates iniciais ocorridos na 1ª Conferência de Comunicação Social da Bahia, que acontece até sábado (16) em Salvador. Representantes da sociedade civil, do parlamento e dos governos federal e estadual discutiram o monopólio das comunicações no Brasil e a dificuldade política de modernizar as regras que regem o setor.

Todos concordaram que somente a mobilização popular pode proporcionar reais mudanças. “É uma questão de correlação de forças. Enfrentar essa batalha depende de decisão, depende de ousadia como essa que está sendo demonstrada aqui na Bahia, mas depende, sobretudo, de acúmulo de forças”, disse o jornalista Carlos Tibúrcio, que é assessor especial da Presidência da República. Para Tibúrcio, esse acúmulo em torno das questões da comunicação “vem se dando de maneira progressiva e significativa” no Brasil: “O desenvolvimento de novos meios tecnológicos tem gerado tensões e criado a necessidade de novas formas de relações sociais e de relações de propriedade para um sistema que tem se tornado cada vez mais concentrado e monopolizado por alguns, determinando de maneira muito forte o que a maioria das pessoas lê, ouve e vê”.

Integrante da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados, Luiza Erundina (PSB-SP) citou uma luta que se trava nesse momento sem que a população seja informada pela grande mídia: “Agora mesmo, a sociedade civil está fazendo um esforço muito grande para intervir na questão da renovação das concessões das grandes redes de televisão do Brasil. A Globo, a Bandeirantes e a Record são redes nacionais que têm suas concessões vencidas já desde o ano passado e querem renovar essas concessões. Alguns parlamentares da Comissão de Ciência e Tecnologia e representantes da sociedade civil vêm se reunindo sistematicamente, de forma persistente e generosa para tentar influir na definição da renovação dessas outorgas e dessas concessões”, disse.

Erundina reconhece que falta acúmulo político para fazer com que a renovação das concessões para as grandes redes seja feita de forma a atender os interesses do povo brasileiro ou, no mínimo, seja realizada de maneira transparente e discutida junto à sociedade: “Sabemos que o fato de não termos acumulado mais na sociedade, do ponto de vista político, em relação à questão das comunicações nos deixa em dificuldade até para imaginar ser possível a não renovação de uma ou outra dessas concessões”, disse a deputada.

EXPECTATIVAS REDUZIDAS

Ainda assim, afirma Erundina, a sociedade pode tentar interferir no processo: “Para sermos realistas, reduzimos nossa expectativa e queremos pelo menos discutir as regras, as normas, aquilo que é exigido dessas emissoras que operam esse sistema fantástico e que aumentam sua potencialidade e o seu poder com a incorporação dessas novas tecnologias. A sociedade civil precisa dizer que tipo de comunicação quer no Brasil, quais são as regras que precisam ser seguidas e observadas religiosamente por essas emissoras. Outorga de rádio e televisão é outorga de um serviço público, de um bem público. É um patrimônio da sociedade e do estado brasileiro e, como tal, tem que estar sob o controle, sob a fiscalização e sob o comando da sociedade civil organizada”.

A dificuldade política em lidar com os empresários que monopolizam a mídia no Brasil também foi citada por Tibúrcio: “Os meios de comunicação debatem tudo, menos a realidade deles próprios. É como se a comunicação fosse um tema que não pudesse ser objeto da informação diária do cidadão”, disse, citando em seguida outra discussão pertinente ao setor que não é tratada pelos principais veículos e, por isso, permanece ignorada pela maioria da população: “No Brasil, a legislação permite o que se chama de sociedade cruzada, que autoriza um mesmo grupo de mídia a ser proprietário de veículos impressos, de rádios, de televisão e de portais na internet, exercendo um verdadeiro controle do processo de informação. Isso não é permitido na maioria dos países”.

Para o assessor da Presidência, esse modelo deveria ser rediscutido, mas o tema enfrenta forte resistência por parte das grandes empresas do setor: “Tanto defendem a democracia, tanto defendem a liberdade de expressão, mas não admitem como pressuposto dessa liberdade uma diversidade maior. Isso se explicita em regras e jurisprudências que são criadas e que de certa forma dificultam aos governos tomar atitudes novas que façam florescer ou se fortalecer meios de comunicação alternativos, que não estejam vinculados aos grandes monopólios de comunicação do Brasil e do exterior”, disse Tibúrcio.

FORTALECER A SOCIEDADE CIVIL

O fortalecimento na sociedade de iniciativas pela democratização da comunicação social é apontado como o único caminho possível para se romper a forte muralha erguida pelas doze famílias que controlam os principais meios de difusão de informações no Brasil: “A presença das entidades da sociedade civil é o que nos dá fôlego, força e respaldo político para tentar romper com as dificuldades, os bloqueios e os impasses que se colocam, porque não há vontade daqueles que detém o monopólio das comunicações no Brasil para que se avance em torno de um marco regulatório, que se defina uma política nacional de comunicação social”, disse Luiza Erundina.

Carlos Tibúrcio afirmou acreditar que a realização de uma primeira conferência em um estado brasileiro sirva de impulso para deslanchar a organização de uma conferência nacional: “Temos que discutir essa questão fundamental, que é a questão da comunicação no Brasil. Nesse sentido, a Bahia exerce um papel de vanguarda, um papel pioneiro que certamente será seguido pelos outros estados como condição indispensável para que o movimento se fortaleça e consigamos realizar a 1ª Conferência Nacional de Comunicação. O que estamos vivenciando aqui terá sem dúvida nenhuma um papel muito importante no desenrolar desse processo”.

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