sábado, 12 de julho de 2008

LE MONDE: “OS AMERICANOS SÃO ESTÚPIDOS”

O jornal francês Le Monde publicou hoje (12/07), com texto de Cécile Gregoriades, uma entrevista com Rick Shenkman, escritor e professor de história na Universidade George Mason-EUA. Nessa entrevista, ele afirma que "os americanos são estúpidos".

Reproduzo a seguir o texto que li no portal UOL, em tradução de Jean-Yves de Neufville:

RICK SHENKMAN: "A AMÉRICA É UMA DEMOCRACIA QUE ESTÁ MAL DAS PERNAS"

“Entrevista concedida ao "Le Monde" por Rick Shenkman, professor de história na Universidade George Mason e autor de "Just How Stupid Are We? Facing the Truth About the American Voter" (O quanto estúpidos somos nós? Encarando a verdade a respeito do eleitor americano”, um livro lançado nos Estados Unidos em junho de 2008).

Ele se diz alarmado com a apatia política dos americanos. Segundo ele, a população não procura se informar e acaba se tornando uma presa fácil para os políticos que exploram sua ignorância. Autor de vários best-sellers, Shenkman é mais conhecido no Brasil pelo seu livro "As mais famosas lendas, mitos e mentiras da história do mundo" (Ediouro).

Le Monde - O senhor afirma que "os americanos são estúpidos". O que está querendo dizer com isso?

Rick Shenkman - Apenas dois americanos em cada cinco são capazes de nomear os três poderes do Estado. Cinco anos depois do começo da invasão do Iraque e quinze anos depois da guerra do Golfo, seis em cada sete americanos se mostram incapazes de localizar o Iraque num mapa. Por fim, às vésperas da guerra no Iraque, 60% da população acreditava que Saddam Hussein estava por trás dos atentados de 11 de setembro de 2001, mesmo se não existia prova alguma disso.

Eu utilizo o termo "estúpido" para chocar. Quero simplesmente dizer que os americanos não têm nenhum conhecimento da política e não estão informados do que acontece no mundo. Com isso, eles são prezas fáceis para os políticos que os "acariciam".

Le Monde - Contudo, os diplomados são atualmente mais numerosos do que no passado, enquanto os veículos da mídia são onipresentes. Os americanos deveriam estar mais bem informados do que nunca.

Rick Shenkman - É verdade, este é mesmo um paradoxo. Em 1940, mais da metade dos americanos não seguiam estudos além do colégio, e agora, a maioria dentre eles obtém um diploma universitário. Mas as pessoas são cada vez mais incultas. Durante os anos 1950, 10% da população desconheciam a diferença entre o Partido Democrata e o Partido Republicano, enquanto durante os anos 1980, esta proporção passou para 30%.

Eu penso que a televisão exerceu um papel particularmente nefasto neste processo de alienação do espírito político das pessoas. Desde que a televisão se tornou o novo grande meio de comunicação de massa durante os anos 1960, o seu nível de informação diminuiu. O conteúdo televisivo é superficial, manipulador, sensacionalista e pouco propício para o exercício da cidadania.

Le Monde - Se os cidadãos preferem evitar a política, não seria porque eles estão desiludidos com os seus políticos?

Rick Shenkman - Sim, em parte isso é verdadeiro. A guerra no Vietnã, o caso Watergate e o caso Irã Contras tornaram os americanos amargos em relação à política. Mas, muito além da desconfiança, existe uma falta real de atenção, e para mim, este é o resultado da nossa sociedade de consumo, encarnada pelo reinado da televisão. Nós dispomos de tantas formas de divertimento em nossa vida: quem quer mesmo passar seu tempo refletindo seriamente a respeito da política enquanto pode entreter-se com videogames, consumir ou fazer milhares de coisas mais agradáveis?

Benjamin Franklin dizia no século 18 que todos nós éramos políticos. No século 21, nós todos somos consumidores. Nós sabemos quanto custa um galão de gasolina, mas nós não temos a menor idéia do montante preciso do orçamento federal. O debate público está reduzido a questões triviais.

Le Monde - A democracia americana estaria mal das pernas?

Rick Shenkman - Os Estados Unidos se parecem mais com uma democracia agora do que há uma centena de anos: o direito de voto foi concedido aos negros, às mulheres e aos hispânicos. Além disso, novas ferramentas de democracia direta foram criadas, tais como as iniciativas populares, os referendos e as eleições primárias, nas quais todo e qualquer cidadão tem a possibilidade de escolher o candidato de um partido sem necessariamente estar afiliado a este partido. Por fim, nós temos as pesquisas de opinião, que verificam constantemente as reações da população.

Nós vivemos, portanto, numa democracia, mas eu diria que ela está mal das pernas. Segundo Thomas Jefferson, "a liberdade e a ignorância nunca combinaram uma com a outra e jamais combinarão". A ignorância das pessoas pode exercer um impacto negativo sobre a nossa democracia; e eu considero que ela está correndo perigo. Da mesma forma que para os alcoólicos anônimos, a primeira coisa a fazer é reconhecer o problema.

Depois da invasão do Iraque, as pessoas reelegeram o próprio candidato que estivera na origem deste caos, George W. Bush. Por trás de um governo, existem eleitores e as pessoas devem aprender a olhar a si mesmas no espelho e reconhecerem as suas responsabilidades, e não apenas terem como único objetivo mudar o governo atual.

Le Monde - O entusiasmo suscitado pela eleição presidencial e o envolvimento de uma nova geração de eleitores não poderiam contribuir para revitalizar o processo?

Rick Shenkman - A taxa de participação deverá ser superior, e isso é positivo, porque quanto mais pessoas votam, mais elas se informam. Mas os dois pré-candidatos à presidencial andaram se comportando da mesma forma que os políticos tradicionais. Barack Obama fala em reinventar a política, mas a sua reinvenção consiste em se mostrar capaz de governar com os republicanos. No final, o candidato democrata vem suscitando uma quantidade enorme de expectativas junto a milhões de eleitores, e eu temo que nos dias que se seguirem às eleições, as pessoas ficarão decepcionadas. E disso resultará uma desconfiança ainda mais maior com a política.”

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